quinta-feira, 31 de julho de 2008

Ah menino George...

Eu o vi crescer...franzino, de poucas palavras. Chegar à escola tímido, cabisbaixo, desconfiado -como boa parte dos alunos inicia - embora seus olhos cor de jabuticaba declarassem desde muito cedo toda sua esperteza.
Seu comportamento hoje chamou-me atenção. Peço para a turma aguardar um momento, estou ocupada com uma visita. Entre uma conversa e outra espio seu jeito. Concentradíssimo em frente ao computador ele olha, mexe, fuça, entra numa pasta, noutra...Eu indago:
_O que queres? Ele:
_ Aquele jogo que você me deu outro dia! Aquele!
Respondo que não está instalado naquele computador e peço que aguarde.
A conversa se estende, percebo sua inquietação. Ele levanta, troca de micro, ocupando um que ora está vago. Novamente, peço que se sente e aquiete.
Entreto-me com a conversa, esqueço-o por alguns instantes. A visita vai embora, retomo a aula dando as coordenadas para a próxima atividade. Paro, olho para ele que continua concentrado. Na tela, o jogo e ele pra lá e prá cá acompanhando com o corpo o movimento do carrinho. Lembro do jogo e do caminho que percorrera para executá-lo. Pastas dentro de pastas e várias etapas para finalmente fazê-lo funcionar. Não precisaram mais que duas ou três vezes me vendo fazer para que fizesse sozinho. Me espanto, deveria repreendê-lo, chamar sua atenção diante de sua desobediência, mas não consigo.
Em vez disso sorrio em pensamento, disfarçando a alegria que senti em vê-lo desobedecer-me.
Me orgulho, lembro-me de alguns dos primeiros objetivos do meu planejamento anual. Estão lá: desenvolver a autonomia, a iniciativa , capacidade de tomar decisões e de solucionar problemas, a intuição e a capacidade de formular hipóteses. Deixo passar... seu empenho e sua capacidade de superação estão acima da minha necessidade de manter o domínio e o controle sobre ele.
São deficientes...dEficientes. O que seriam se não fossem? Superdotados?
Como me surpreendem e como é bom ser surpreendida! Muitas vezes eu própria duvido! Chego a pensar que não há jeito, menosprezo suas capacidades... Algumas vezes, mais rápido do que esperava, aquela criança que passava o dia embaixo da mesa, escondido, como um animal acuado, de repente me olha e pergunta: O que vamos fazer hoje, professora?
Um misto de alegria, satisfação e orgulho tomam conta de mim. Bate o sinal, outra turma, outras histórias...Tantos Rudis, Denilsons, Ramons, Zés, Carlinhos... quantos Georges ainda desejo encontrar!

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Acessibilidade: além da ótica da caridade ou da obrigatoriedade

figura representando um cadeirante Roteiro de férias, aeroporto de Navegantes, SC. Do lado de dentro observo a movimentação na descida dos passageiros. Uma senhora, a última a descer é carregada por um moço. Algumas pessoas tentam auxiliá-lo dada a dificuldade diante do seu peso e pouca largura da escada o que dificulta a movimentação. Até que finalmente chega ao solo e é colocada na cadeira de rodas. Imaginei o transtorno que fora sua subida.
Esta semana li uma reportagem interessante, um site pornô para cegos que virou fenômeno cult nos Estados Unidos. Chamado Porn for the Blind (Pornô para cegos, em tradução literal), o site oferece clipes sonoros que trazem descrições, gravadas por voluntários, de cenas de sexo disponíveis na Internet. O dado que me chamou a atenção foi que somente no mês de abril o site recebeu mais de 150 mil visitas.
E o que uma coisa tem a ver com a outra?
Tem a ver que o Brasil tem, segundo dados do IBGE algo em torno de 25 milhões pessoas com algum tipo de deficiência, ou seja 15% da população ( censo de 2000 )
Tem a ver que 15% da população é um número bastante razoável e merecedor de atenção e investimentos.
Tem a ver que pessoas com deficiência também consomem, também podem produzir, gerar renda, capital social.
Tem a ver que pessoas com deficiência acessam internet e precisam de sites acessíveis, em contrapartida, geram tráfego, movimentam a economia.
Tem a ver que pessoas com deficiência já não ficam mais internadas em orfanatos ou trancadas em casa, elas estão aí. Também viajam, necessitam de transportes adaptados...
Tem a ver que está na hora de se parar de associar acessibilidade com custos e passar a associá-la a investimentos, lucros... se é assim que a sociedade funciona, é assim que deve ser vista.
Tem a ver que as coisas mudaram, que as pessoas com deficiência hoje também são diferentes, e começa haver, ainda que timidamente um despertar da sociedade para isso, mas é preciso acordar, abrir os olhos, vislumbrar possibilidades.
Na verdade nem precisaríamos estar discutindo essas coisas...Não deveríamos discutir o design universal. Design deveria ser universal por excelência. Design universal é para todos: deficientes, pessoas com mobilidade reduzida ou deficiência temporária, idosos, obesos, enfim...mas para isso é preciso haver uma consciência universal, holística...
Mas enquanto isso não acontece, continuamos falando em desenho universal, escola inclusiva e outras lógicas não tão lógicas...

domingo, 20 de julho de 2008

Oito coisas para fazer antes de morrer

Mais um meme...
Recebi da minha amiga Bernardete do Caminhos para Chegar.

1. Escrever uma lista com 8 coisas que sonhamos fazer antes de morrer.
2. Convidar 8 parceiros(as) de blogs amigos para responder também.
3. Comentar no blog de quem nos convidou.
4. Comentar no blog dos nossos(as) convidados(as), para que saibam da “intimação”.
5. Mencionar as regras.

Vamos lá:

Ter dinheiro pra viajar.
Comer e não engordar.
Trabalhar até a idade suportar, mas parar quando desejar.
Escrever um livro nem que seja pra dar.
Aprender a tocar violão e numa roda de amigos, cantar.
De asa delta um dia saltar.
Ter um cavalo pra cavalgar.
Morrer antes de caducar...

Passo a bola para alguns amigos queridos que me visitam e acompanham minhas postagens:

Verônica, do Idéias em Blog
Raquel, do Metamorfose da Libélula
Luiz, do Cultura na Rede
Eloí
Sindy, do Bloguinfo
Thaíza do Kimilokos
Janete, do Um olhar especial sobre a vida na Terra

domingo, 13 de julho de 2008

Hércules e Jiló

Fazia tempo que estava procurando, mas não conseguia encontrar o link para fazer o download. Encontrei, ele pode ser feito aqui.
O software educativo "Hércules e Jiló" foi idealizado para servir de apoio a intervenções pedagógicas no campo das Ciências Naturais, abordando conceitos relacionados com os seres que existem na Terra (diversidade, características, classificação, relações tróficas, ambientes naturais e construídos etc.).

Hércules é o nome de um menino, Jiló é seu cachorrinho. Eles não existem de verdade, mas se transformaram em personagens principais de um programa de computador educativo, criado na Faculdade de Educação (FE) da Universidade de Brasília (UnB). O programa oferece dez jogos que podem ser utilizados pelas crianças no próprio computador ou fora dele, desde que sejam impressos em papel e montados, como dominós. “Nossa idéia é mostrar que as crianças com necessidades especiais são capazes de aprender”, afirma a professora Amaralina Miranda, especialista na área que conclui no ano de 2005 o doutorado sobre o assunto, na Universidade Nacional de Educação à Distância, em Madrid, na Espanha. No programa, as imagens são alegres e coloridas para chamar a atenção e despertar o interesse pelo aprendizado.
Segundo a psicóloga, o programa é recomendado para crianças com necessidades especiais, mas pode ser utilizado por qualquer uma sem maiores dificuldades. Pelo material, elas entram em contato com as ciências naturais, com imagens animadas e as palavras correspondentes, seguindo uma linha Construtivista, que parte do princípio que a criança constrói o seu saber a partir das influências do meio e das situações de aprendizagem que ela vivencia. O diferencial é que o instrumento foi criado por pedagogos, entre eles o professor da FE, Gilberto Lacerda em parceria com bolsistas do curso de Engenharia de Software e não apenas por profissionais da Informática, o que é mais usual. Por isso, ele tem uma linguagem adequada e consegue atingir o público alvo.
O software já foi validado por 50 professores da Secretaria de Educação do Distrito Federal, que também deram sugestões para aprimoramento e foi aplicado em duas turmas, ao todo, com 18 estudantes, nas escolas da 410 sul e Escola Normal de Brasília. A experiência demonstrou que o programa é um excelente material de apoio ao trabalho docente, pois instiga no aluno construções mais elaboradas através do lúdico, ou seja, elas aprendem brincando.
Ao todo, 600 cópias do material financiado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) serão distribuídas por todo o país.
Para saber mais: Hércules e Jiló

quinta-feira, 3 de julho de 2008

Entre iguais e diferentes

várias formas humanas sobrepostas As vezes eles me fazem rir; noutras, me emocionar; muitas vezes, pensar...
Uma aula, um bate papo virtual...
Ele, Ju...alegre, dócil, talentoso, mãos habilidosas, exímio dançarino, meiguice em pessoa, síndrome de down.
Conversa vai, conversa vem...eis que a professora chama para conversar um aluno...
Do outro lado, um menino de mesma síndrome.
Jú olha para a tela...seus olhos se iluminam , sua boca se abre num largo sorriso, ele exclama como se estivesse diante de um espelho:
_ Ele é igual eu!!!
Ô conversa animada! Dispensa até a apresentação, parece se conhecerem de longa data, muita coisa pra contar, muito por dividir...Uma identificação fisionômica... Mas não só. Talvez de sentimentos, de emoções...Talvez ele descubra que entre tantas pessoas, exista mais um com dificuldades, alegrias, frustrações, desejos, angústias semelhantes às suas.
Esse fato me fez pensar sobre a necessidade de identificação com nossos pares. O outro constrói a minha subjetividade, e muitas vezes, temos no outro o reflexo de nossa própria imagem, daí a necessidade de aproximação com nossos semelhantes. Necessitamos dessa convivência, desse (re)conhecimento.
Por outro lado, mesmo estes iguais são, sob um outro foco, totalmente desiguais.
De modo geral é comum termos uma idéia equivocada de que entre pessoas com deficiência intelectual existe uma universalidade de características comuns à todos, como se todo autista ou síndrome de down fosse exatamente igual à todos em condição semelhante, negando-se a substancialidade destes sujeitos. Não temos todos especificidades? Não somos todos diferentes uns dos outros? Por que com eles seria diferente? A deficiência é uma característica da pessoa, não a própria pessoa.
No entanto, reconhecer-se, identificar-se, ter necessidade da convivência com nossos iguais não significa isolar-se, segregar-se, excluir-se ou excluir.
Conceitos inseparáveis, igualdade e diferença parecem andar sempre juntas. Inclusão e exclusão também. Uma só existe em função da outra. Se tanto apregoamos a tal da inclusão é porque de fato ela ainda não existe, porque ainda existe preconceito, resistência à mudança, exclusão.
Na mesma proporção, necessitamos do convívio com nossos iguais e com nossos diferentes.
Do convívio com as pessoas surgem afinidades e discrepâncias, sendo ambas importantes para a formação do todo humano que somos. Entre iguais aprendemos a nos reconhecer; entre diferentes, a nos respeitar.